Sexta feira, 17 de janeiro, por volta das 20:30 saía de casa com aquela habitual sensação de que me tinha esquecido de alguma coisa. Contudo, a possibilidade de me ter esquecido do que quer que fosse estava longe de ser uma preocupação! Afinal de contas, daqui a um par de horas estaria de volta àquele sítio.
Julgo que esta sensação que provei na noite de sexta feira descreve muito bem o que para mim está a ser viver a Casa Velha. Um sítio (que já vai para além disso) onde a descoberta do sentido parece escapar a todos os imprevistos. E é nesta clarificação embebida em alegria e amor, que encontro uma enorme vontade de viver a Casa Velha fora dos próprios limites geográficos de Vale Travesso.
Cada fim de semana atravessado é muito único e, por isso, marcante. Neste último encontro foram tantos os momentos chave, que não consigo precisar aquele que foi para mim o mais especial. Consigo, porém, realçar o que algumas das partes do fim de semana fizeram-me viver e aquilo que deixaram em mim.
Na chegada pairou o espírito de comunidade e de pertença no ar. Apesar de parecer simples, a troca de abraços e de palmadinhas nas costas foi, sem dúvida, um ponto alto. Já no dia de Sábado, embora se prolongasse tudo aquilo que tinha experimentado na noite anterior, havia algo mais: o sentido de missão, de utilidade e a piedade. A possibilidade de perceber o fruto do trabalho de cada um enquanto podadores da hera ou a de receber um abraço seguido por um “gosto mesmo de ti”, dado pelo Luís (um utente do CRIO), foi muitíssimo gratificante.
No domingo, tivemos a oportunidade de poder ouvir a história de vida do René, um jesuíta filipino que esteve estes dias na Casa Velha. Este foi um momento muito forte e inspirador. Depois, René convidou-nos a participar numa dinâmica que consistia em pintarmos algo em aguarelas. No entanto, a técnica por ele proposta ia muito além daquela a que eu estava habituado: em vez de traçar a pintura de forma controlada com o pincel, era suposto molharmos a folha, de modo que a tinta nela aplicada fluísse e se espalhasse por força da gravidade. Esta forma de pintar é, de certa forma, um símbolo da entrega, pois leva uma pessoa a deixar-se ir e a acabar por ficar espantada.
Embora não tenha exposto nestas palavras grande parte do que se passou neste fim de semana e, muito menos, do que está a ser a experiência de atravessado, fica aqui um pedacinho.
Francisco Bivar, Portimão