A resposta da missão aos desafios e mudanças em 2021

por Pedro Walpole sj, publicado no Ecojesuit a 4 de janeiro de 2021

Recentemente, a minha equipa de trabalho e eu iniciámos uma atividade de escuta para entender como poderíamos tirar o melhor partido possível do confinamento contínuo – a sua imobilidade, o distanciamento e as incertezas, a falta da família – e aprofundar a nossa própria fé, ao tentar encontrar caminhos para o próximo ano. Vivemos nas colinas de Mindanao, nas Filipinas, e trabalhamos na recuperação dos ecossistemas, na gestão sustentável da terra e na liderança juvenil.

Entretanto, o mundo vive sob a constante ameaça e perda devido à pandemia, bem como as incertezas na distribuição das vacinas, e está a avançar em direções opostas política e economicamente, com uma vulnerabilidade crescente para uma população cada vez mais pobre, enquanto enfrentamos uma mudança de época em termos de destruição ambiental.

OUVIR o contexto

Fizemos perguntas. Como compreendemos o mundo onde vivemos? Como entendemos as nossas relações e o nosso trabalho? Que expressões ou conceitos utilizamos para comunicar pessoalmente no local onde nos encontramos? Como lidamos com esta circunstância no nosso trabalho e como o vivemos no tempo presente? Talvez, muitos de nós tenham encontrado um caminho, mas nem sempre é um caminho com o qual nos sentimos particularmente satisfeitos.

Análise das MUDANÇAS

Muitos no grupo partilharam o seu olhar sobre as incertezas inseridas em realidades que nos superam e que nos afetam. Existe uma grande necessidade de voltar a viver normalmente, mas é um normal diferente, onde necessitamos da graça e da aceitação. Há um vácuo e uma necessidade de nos alinharmos e nos adaptarmos a muitas questões ainda sem respostas.

São necessários novos caminhos à medida que enfrentamos os desafios e as mudanças de 2021, e o contexto não é apenas o vírus.

Há problemas muito maiores em muitas partes do mundo, agravando realidades incertas, a nível local e global. A acumulação de lucros e a pobreza, a segurança alimentar, os extremos climáticos, o aumento das armas, a destruição ecológica e as deslocações sociais, entre muitos outros.

Estaremos preparados todas as manhãs para enfrentar o que é diferente? Será que vemos o que é diferente no acesso aos mercados locais, aos hospitais, aos serviços governamentais e à agricultura?

Será que reparamos que as crianças estão a estudar menos sob o sistema modular sem aulas? No entanto, muitas delas estão também a adquirir uma maior capacidade de reflexão e de compreensão e a colaborarem virtualmente, realidade que nos afeta no terreno. Quando as crianças regressarem à escola, existirão diferentes acessos, informação, reflexão, compreensão e, esperamos, uma atitude diferente.

Todas estas coisas estão a mudar. À medida que estão a mudar, queremos saber mais sobre elas, e não simplesmente como gostaríamos que elas fossem e como se tornaram normais.

Será que deixamos a realidade mudar-nos ou mudamos nós a realidade quando podemos? Esta é a grande complexidade do nosso tempo, e à pergunta “quando” respondemos agora.

O OBJETIVO é o como

O objetivo que ganhou expressão no grupo é a necessidade de mudar de posição, de mudar a perspetiva para uma que não esteja cheia de expectativas. É como chegar a um novo lugar ou a uma nova etapa de vida onde tudo muda, onde é preciso estabelecer um conjunto diferente de relações, embora tudo à superfície possa parecer inalterado.

A MISSÃO é o porquê

O apelo de hoje é sobre a missão. Trata-se de ser ativo sem ter respostas, como um missionário enviado para uma nova terra, onde tem de ouvir e aprender uma nova língua e um novo modo de vida, e estar sempre aberto e expectante sobre as pessoas, os caminhos distintos e as circunstâncias diferentes.

Temos de estar abertos, sensíveis às coisas que nos esperam, enfrentando o desconhecido e o incerto. A atitude atual e pós-pandémica é a missão.

Estar em missão é estar preparado para tudo, preparado para encontrar o bem e anunciá-lo. A missão implica ter a sensibilidade e ouvir, procurar a oportunidade de algo melhor, estar lado a lado com as pessoas para o bem maior, e procurar novos caminhos para aumentar o bem comum.

A missão dá-nos a sensação de avançar, de sermos humildes perante os erros e de sairmos reforçados pela escuta e colaboração.

Somos todos convidados à missão. Percebemos que não precisamos de respostas para começar e podemos mudar de posição e não assumir o modo habitual de agir. Pela escuta, encontramos os passos a dar.

A etapa seguinte foi refletirmos sobre o significado da missão para cada um. Eis algumas respostas do grupo:

Em poucas palavras, é algo de que não desisto.

É a razão pela qual eu faço as coisas, é algo que vem de dentro.

É uma expressão de quem procuro ser, é um serviço para o bem comum, é um desafio e um desafio para uma ação sustentada.

Afirma uma integridade de vida, que não é determinada por problemas atuais e desconhecidos.

É um objetivo para além do horizonte. Significa que fiz uma escolha e, com outros que encontrei, faremos a diferença.

Estamos emocionalmente e conceptualmente a tentar saber onde nos encontramos, para além do emprego que temos ou do trabalho que fazemos. É um processo formativo importante, porque nos coloca em contacto direto (táctil) com os desafios e as mudanças. Não o controlamos, mas estamos em contacto direto com o local. Estamos em contacto com a realidade. Tentaremos tirar o melhor partido da realidade. Sabemos que isto é um desafio e é por isso que estamos envolvidos.

Como é que isto capta o que estamos a tentar fazer e nos dá o “como” agir num determinado contexto? Queremos esta mudança de posição, porque alimentamos uma esperança ativa – a nossa posição ou direção é a de irmos em missão.

É uma abertura ao que quer que encontremos. Afirma aquilo de que estamos a falar e a necessidade de ver os desafios dum modo novo. Precisamos da mensagem certa para motivar as pessoas certas.

A MENSAGEM é a escolha

Qual é a mensagem do nosso grupo para as pessoas de Upper Pulangi, especialmente para os jovens que aparentemente não conseguem encontrar nada para fazer e se tornam cada vez mais istambay (calão filipino para “andar por aí”, derivado da expressão inglesa “stand by”)? Que mensagem queremos passar?

A necessidade parece ser a de promover as histórias locais, a união, e de estarmos mais conscientes sobre o acompanhamento e não perdermos a esperança. Há necessidade de educar as crianças e os jovens dum modo mais abrangente e ajudá-los a perceber as mudanças que estão a acontecer e afirmar que são capazes de enfrentar este desafio e de encontrar novas oportunidades.

Por vezes parece que nada se move, mas há tanta mudança. O mundo em que entramos em 2021 vai ser muito diferente das expectativas pessoais e precisamos de reconhecer as diferenças. É tempo para uma escuta profunda se quisermos alcançar a paz e a confiança (que não vêm de fora). É um tempo para nos comprometermos. Como alguém disse, há uma certa teimosia em seguir em frente.

Temos de compreender esta mensagem, porque esta mensagem é uma escolha. Este é um momento de escolha ativa. Não pode ser um tempo de indiferença, há muitas escolhas a serem feitas.

Queremos uma mensagem para o mundo atual que se comunique. Temos de estar unidos para avançarmos. Temos de promover uma atitude de missão, de escolha, para estarmos envolvidos. Missão é envolvimento. Não é a resolução de problemas. É a incorporação total do próprio ser. É a conversão.

O desafio é que as pessoas façam uma escolha e façam a escolha certa. Se o fizermos, não estaremos a trabalhar e a comunicar da mesma forma. Devido aos tempos que vivemos, a forma como trabalhamos produz um outro efeito. Não será normal. Vai mudar-nos a nós e àqueles com quem estamos em contacto.

Um exemplo local é a situação do milho, nos planaltos. A colheita recente foi boa, mas ninguém conseguiu armazenar o milho e a produção foi de qualquer forma uma transação contratada logo à partida. Assim, os preços “caíram” no mês passado para PhP 8,00 (US$ 0,17 ou Euro 0,14) por quilo. Mais do que qualquer pandemia, a manipulação dos preços, que ocorre todos os anos nos planaltos, destrói cada vez mais famílias de agricultores e aumenta a área de terra/floresta queimada para sobreviver. Esta situação é global.

Neste momento, o normal é o desespero. Há 95.000 tratores em Nova Deli e dois milhões de pessoas. Esta é a maior manifestação no mundo, que enfrenta a maior brutalidade. Ainda assim dispostos a negociar com um governo que está do lado do crescimento das empresas em detrimento das pessoas.

Isto não é normal e os agricultores não vão desistir. Isto irá criar novas exigências algures no mundo. Partilhamos alguns artigos recentes relacionados com este assunto:

Irão as leis agrícolas beneficiar os nossos agricultores? Mito da libertação do agricultor (Indian Currents)

A agricultura industrial está a criar veneno, não alimentos (Delhi Post)

O ministro de Deli, Kailash Gahlot, apresenta uma resolução na Assembleia Estatal para revogar três leis no sector da agricultura (Hindustan Times)

SC diz que os agricultores têm o direito a protestar, sugere que o Centro coloque as leis agrícolas em espera (The Indian Express)

A Califórnia será diferente no próximo ano, assim que os habitantes se organizarem e reconhecerem coletivamente que existe uma vulnerabilidade crescente devido os incêndios e à forma como vivemos. O Los Angeles Times analisou, em Setembro de 2020, décadas de dados que rastreiam os incêndios na Califórnia e a destruição causada e verificou que “os incêndios e os seus efeitos complexos intensificaram-se nos últimos anos – e há poucos sinais de que as coisas irão melhorar”.

Ouvir as histórias dos jovens e entender as suas escolhas

Façamos uma pausa para refletir: perguntamos o que nos faz tornarmo-nos mais positivos, e termos um pensamento mais virado para o futuro. O que acontece quando sentimos essa diferença? Para alguns, o debate mostra o que é melhor, que o nosso trabalho é a melhor escolha, e levanta-nos questões pessoais para o nosso crescimento.

Estaremos a fazer o nosso melhor para concretizar esta escolha? Isso pode dar ainda mais força ao trabalho que realizamos. As pessoas consideram isto como um compromisso. Aqueles que não se conseguem comprometer não duram, ou lutam do lado da negatividade de acordo com os tempos, não reparando no compromisso.

Os jovens têm dificuldade em fazer uma escolha e em agarrar-se a essa escolha. Vivem esta escolha diariamente. Quando o contexto é desconcertante, aborrecido ou sem confiança, eles entram compreensivelmente em depressão, dão respostas radicais ou disfuncionais e adotam caprichos. É, em parte, uma questão de entender a comunidade e a oportunidade. Se os jovens procuram encorajamento, apesar das exigências radicais de ambos os lados para se alistarem no exército ou pegarem em armas, fazem-no em muitas partes do mundo onde se sentem perdidos. Após a colheita do milho, alguns jovens encontraram trabalho temporário na construção de estradas.

Ouvindo as histórias dos jovens, que recentemente vieram trabalhar em grupo na quinta, procurámos falar-lhes sobre as responsabilidades e direitos laborais, a gestão de finanças pessoais, a aquisição de competências familiares e prioridades.

A maioria procura encontrar alternativas onde tentam equilibrar as suas escolhas pessoais, ou onde se sentem mais confortáveis (seguros), querem uma mota, e o que lhes dará uma vida mais estável e realizada, onde possam viver os seus sonhos em relação aos outros.

Uma boa vida não é o normal no mundo de hoje, uma vida equilibrada, uma vez que esta não é a norma. No entanto, lemos constantemente muitas histórias sobre o equilíbrio e a beleza encontrados no pequeno.

Procuramos a vida, não a normalidade. Queremos viver em comunidade e mapear o que é ser humano, belo, acarinhado e esperançoso – não queremos o status quo.

Assim, em equipa, procuramos motivar e gerir este contexto e as consequências das mudanças e das escolhas, trabalhando com a terra e com os jovens.

Procuramos ouvir mais e partimos duma atitude de missão. Mudanças e escolhas são o que procuramos com os jovens no mundo e para isso, precisamos de partilhar novos caminhos e de semear sementes novas.

Caro leitor, agora que chegou a este ponto da reflexão, pode perguntar-se: Qual é a palavra mais importante que retirou desta leitura e onde quer plantar a semente?

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